«Todos sabem de onde vimos – de uma das maiores desorganizações que em Portugal se devem ter verificado na economia, nas finanças, na política, na administração pública. […]
Não há Estado forte onde o Poder Executivo o não é, e o enfraquecimento deste é a característica geral dos regimes políticos dominados pelo liberalismo individualista ou socialista, pelo espírito partidário e pelos excessos e desordens do parlamentarismo.
O princípio salutar da divisão, harmonia e independência dos poderes está praticamente desvirtuado pelos costumes parlamentares e até por normas insertas nas constituições relativas à eleição presidencial e à nomeação e demissão dos ministros. Essas normas vêm sujeitando, de facto, o Poder Executivo ao Legislativo, exercido por maiorias variáveis e ocasionais, e à mercê também de votações de centros políticos estranhos aos Poderes Públicos. É uma necessidade fundamental restituir esse princípio a alguma coisa de real e de efectivo, e, bem observados os acontecimentos políticos da Europa nos últimos anos, pode afirmar-se que, tendo-se tornado inevitáveis pelas desordens daquelas engrenagens, tudo aí gira à volta da preocupação dominante de achar o sistema que dê ao Poder Executivo independência, estabilidade, prestígio e força.»
Salazar, Discurso de 30 de Julho de 1930
Como justifica Salazar a necessidade de um governo forte?
«A polícia política era a espinha dorsal do sistema: servida por uma larga rede de informadores estipendiados (nos locais de trabalho, nas escolas, nos teatros, nos centros de convívio, etc.), dotada de verbas cujo uso escapava ao controlo público, a P.V.D.E./P.I.D.E. podia deter quem entendesse, sem culpa formada e sem mandato ou fiscalização judicial, por períodos que foram sendo sucessivamente alargados até chegar aos seis meses. Durante esse tempo, os detidos podiam ser conservados incomunicáveis, sem visitas nem assistência dos seus advogados: era a fase das “averiguações”, dos “interrogatórios” – da instrução preparatória para os detidos levados a tribunal –, que era, inicialmente, secreta e estava a cargo da polícia política. Enquanto ela durava, a P.V.D.E./P.I.D.E. permitia-se exercer sobre os detidos, sem pressas, uma larga panóplia de violências e torturas físicas e psicológicas como forma de lhes extorquir “confissões” ou de simplesmente os intimidar. […] Isto significava, na prática, que a polícia política tinha a possibilidade inteiramente discriminatória, e sem qualquer controlo judicial, de aplicar “penas” de prisão até um ano, nos seus cárceres privativos, a quem entendesse e por que motivo entendesse.
Na realidade, este sistema conferia à polícia política o poder de prender qualquer cidadão por quanto tempo quisesse: bastava, ao fim de um ano de detenção preventiva, voltar a prendê-lo preventivamente, à porta da cadeia, por mais um ano, e assim sucessivamente […].»
Portugal e o Estado Novo (1930-1960), coordenação de Fernando Rosas, vol. XII da Nova História de Portugal, dir. de Joel Serrão e A. H. de Oliveira Marques, Lisboa, Ed. Presença, 1992
Explique em que assentou a adopção do modelo italiano nas instituições e no imaginário político em Portugal.